Não Alimente Seus Paquidermes

Com seu tamanho gigante, humor variável, vontade própria e dificuldades de serem domados, os paquidermes dominam o planeta terra.

Sim! É verdade.

Mas pare… não estou falando dos animais de quatro patas da ordem dos proboscídeos. Estou falando dos sistemas de informação monolíticos que assolam as organizações brasileiras.

Provavelmente você já deve ter visto algumas destas bestas. Elas podem ser reconhecidas pelas seguintes catacterísticas:

  • Bancos de dados com centenas de tabelas;
  • Centenas de telas e relatórios;
  • Repositórios de código com centenas de milhares de linhas de códigos
  • Linguagens arcaicas;
  • Enorme débito técnico;
  • Ausência de testes automatizados;
  • Baixo uso de práticas provadas de engenharia de software e DevOps.

Eles atendem por nomes como ERPs, MRP, CRMs, Portais e sistemas de informação com siglas que começam pela letra S. Na prática, estes produtos geram urgências em base semanal e tornam a vista dos seus gestores um inferno.

Para piorar a situação, muitos gestores e desenvolvedores continuam a alimentar estes paquidermes em base mensal. Eles constroem novos módulos nestes produtos. E devido ao seu tamanho e a ausência de testes automatizados, cada modificação tende a gerar efeitos colaterais que se manifestam em problemas que acontecem semanas ou meses depois da manutenção originalmente realizada.

A Lei dos Retornos Decrescentes dos Softwares

Na engenharia de software, quanto maior um sistema maior o custo de manter cada unidade deste sistema. Ou seja, se um sistema novo é duas vezes maior quem um sistema original base, ele provavelmente terá custado mais que duas vezes o custo do sistema base. E provavelemente o sistema novo terá uma complexidade ciclomática média maior que o sistema base e uma produtividade de manutenção muito ruim. Isso pode ser observado informalmente no repositório público de sistemas do SonarQube online. E para os mais céticos, recomendo a leitura dos artigos científicos publicados pelo brilhante cientista Capers Jones a respeito. Recomendo ainda o seu excelente livro de medição aplicada de software.

Em termos simples — Quanto maior o número de linhas, telas, funções e tabelas do seu sistema, pior será a sua densidade de defeitos e a complexidade ciclomática média. Mais medonho, mais feio e com maior chance de gerar problemas para você e o seu time no seu ambiente de produção.

Estrangule seus paquidermes… em 7 passos

Vamos lembrar que não estou falando dos animais de quatro patas com dentes de marfim ameaçados de extinção na África. Estou falando dos sistemas monolíticos gigantes e mal-humorados. E o padrão de estrangulamento (Strangler) já foi até documentado na literatura pelo profícuo autor Martin Fowler .

Aponto aqui algumas dicas para estrangular seus paquidermes:

  1. Comece a expor as funcionalidades existentes nos sistemas monolíticos legados através de APIs. Em linhas gerais, crie APIs que irão expor funcionalidades Cobol, PL-SQL, C, C# ou Java de uma forma governada. Devemos dar sobrevida a estes código, ao mesmo tempo que começamos a pavimentar um caminho paralelo. A respeito de APIs, apresentei algumas dicas de como iniciar a sua jornada nesse blog.
  2. Considere reduzir o tamanho dos seus novos sistemas. Mesmo que você tenha produtos de enorme porte para serem construídos, construa-os em módulos independentes e autônomos. Se possível, considere abordagem mais modernas de serviços como os microsserviços ou nanoserviços. Microsserviços são serviços autônomos com linhas de base de código reduzidas e que operam de forma autônoma com suas próprias bases de dados. Algumas das vantagens do uso deste estilo incluem:
  • Cada microsserviço é relativamente pequeno. Com isso o código é facilmente compreendido pelo desenvolvedor. A baixa quantidade de código não torna a IDE lenta, tornando os desenvolvedores mais produtivos. Além disso, cada serviço inicia muito mais rápido que uma grande aplicação monolítica. Isso torna os desenvolvedores mais produtivos e agiliza as implantações. A arquitetura de microsserviços facilita escalar o desenvolvimento. Pode-se organizar o esforço de desenvolvimento em vários times pequenos com o uso de métodos ágeis e práticas DevOps. Cada equipe é responsável pelo desenvolvimento e implantação de um único serviço ou um conjunto de serviços relacionados. E cada time pode desenvolver, implantar e escalar seus serviços, independente de todos os outros times.
  • Cada microsserviço pode ser implantado independentemente de outros serviços. Caso os desenvolvedores responsáveis por um serviço necessitem implantar uma modificação para um determinado serviço que não impacte a API deste serviço, não há necessidade de coordenação com outros desenvolvedores. Pode-se simplesmente implantar as modificações. A arquitetura de microsserviços torna viável a integração e a implantação contínua.
  • Além disso, cada microsserviço pode ser escalado de forma independente de outros serviços através da duplicação ou particionamento. Cada serviço pode ser implantado em um hardware mais adequado para as exigências de seus recursos. E tecnologias de contêineres como o Docker facilitam a gestão e isolamento de dependências tecnológicas.

3. Considere o uso de tecnologias mais simples e produtivas. Saem de cenas servidores de aplicação e Web pesados como IIS ou Websphere, ESBs, BPMS, o .NET Framework e até mesmo o Java EE full stack. Entram em cena tecnologias mais simples como .NET Core para C#, Spring Boot para Java, Node.JS e linguagens dinâmicas como Python e Javascript.

4. Melhore a maturidade de testes do seu time. Comece a automatizar testes funcionais e introduza suítes de testes de unidade nos seus novos produtos.

5. Comece a usar tecnologias de conteinerização para tomar contas dos seus novos produtos e dos paquidermes legados. Vagrant, Docker, Mesos, Kubernetes e o Rancher, entre outras tecnologias, são muito bem vindos neste novo jogo.

6. Faça benchmarking. Visite empresas na sua cidade ou estado que estão já usando esta abordagem. Aprenda com os seus erros e sucessos.

7. Tenha paciência. Você nao irá estrangular um paquiderme da TI em uma semana. Este processo tende a ser demorado e pode demorar meses ou anos. A Netflix, por exemplo, demorou aproximadamente 8 anos para migrar o seu extinto sistema paquidérmico para centenas de microsserviços que hoje dominam a sua operação em produção.

Não aumente mais a entropia da sua TI

Vamos lembrar que grandes sistemas tentem a aumentar a entropia na sua TI. E a entropia é danosa. Ela aumenta o passivo técnico, gera mais incidentes em produção e provoca efeitos sistêmicos graves em projetos como o tão comum padrão Firefighting.

Está declarada aberta a temporada de caça aos paquidermes da TI

O Gartner Group observa que, na média, empresas gastam 70% do seu orçamento de TI com atividades de sustentação. E os paquidermes infelizmente contribuem para este horroroso número. Sobra apenas 30% para atividades que ajudam a crescer e transformar o negócio. E isso ajuda a explicar o porque as áreas de negócio tem uma reputação tão ruim do nosso trabalho.

Considere se você quer manter a TI da sua empresa na média mundial de investimento ou avançar a maturidade com estrangulamento o abate dos paquidermes legados e a introdução de sistemas com arquiteturas de mais fácil construção e manutenção.

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