O modelo de Squads advoga que você aproxime as pessoas que estejam no núcleo da entrega e sustentação de seus produtos de negócio. Essas pessoas trabalham juntas em forte cooperação técnica, fazem uso de métodos ágeis como Kanban, Lean, Scrum ou LESS e entregam produtos para os seus usuários com boa frequência.
Ao mesmo tempo, as Squads são constituídas sobre estruturas organizacionais já existentes. E nessas estruturas temos muitos gerentes, dispostos em silos funcionais e com receio que alguém mexa em seus domínios.
Ouvi recentemente a dúvida de um gerente de uma dessas empresas com muitos gerentes. – “Qual o papel do gerente nas Squads?”.
Como a pergunta não tem uma resposta trivial ou única, compilo aqui algumas respostas que o mercado tem trazido para essa questão.
O Gerente em Projetos Tradicionais
Tradicionalmente, os gerentes estão frequentemente envolvidos em decidir qual é o trabalho a ser feito e estão também envolvidos na decisão de como fazê-lo. Entretanto, gerentes não são necessariamente excelentes analistas de negócio. E ao usar o seu poder para decidir qual o trabalho deve ser feito, eles podem deixar escapar a oportunidade de aplicar a melhor engenharia de valor em seus produtos.
Gerentes também não são normalmente excelentes técnicos e ao tentar dizer como um técnico deveria fazer o seu trabalho eles realizam micro-gerenciamento. Microgerenciar pessoas está correlacionado com frustração, desmotivação e até mesmo demissões voluntárias.
O Gerente nos Métodos Ágeis
Nos métodos ágeis, o papel do gerente não é mais responsável por definir qual é o trabalho a ser feito. A decisão sobre o que a equipe deveria trabalhar não está mais sob o controle do gerente, mas é decidida pelo Dono do Produto. Ele tem uma visão geral do produto e o que é mais valioso para os clientes. E portanto ele prioriza o trabalho que a equipe deve fazer.
E o papel do gerente nos métodos ágeis também não é responsável por definir como um trabalho vai ser feito. A decisão sobre como a equipe deve funcionar é delegada à equipe. A equipe é uma equipe de autogerenciamento e, juntos, precisa refletir sobre o que deve ser feito e decidir como farão isso e como vão melhorar continuamente o seu trabalho.
Mas, então, o que o gerente deve fazer?
O papel da gerência intermediária é enxergar o todo e melhorar a capacidade da organização em construir produtos de excelente qualidade. Ele deve ajudar a equipe e o Scrum Master na remoção de obstáculos e melhorias. Ele deve ensinar a equipe a melhorar e como resolver seus próprios problemas. Ele deve ir e ver (Genchi Genbutsu) para entender o que realmente está acontecendo no local de trabalho, e ver como ele pode ajudar melhor a equipe a melhorar seu trabalho.
O papel da alta administração é menos alterado, pois ainda estão envolvidos com decisões estratégicas relacionadas à empresa e seus produtos. Ao mesmo tempo, é também o papel da alta gerência ensinar aos gerentes intermediários como ensinar as pessoas. Ele também precisam ajudar seus subordinados na resolução de problemas e como podem se tornar melhor no treinamento dos seus times.
O Gerente nas Squads – O Que Tenho Observado
Modelo 1 – Gerente Como Dono do Produto
Em muitas empresas, os gerentes intermediários são pessoas centralizadoras devido à cultura gerencial instalada. E nesse tipo de cenário tenho visto gerentes acumulando também o papel do PO. Isso dá a eles autonomia sobre o que fazer sem violar práticas de métodos ágeis como o Scrum.
O risco aqui é que o gerente simplesmente use o seu bom senso para trabalhar a priorização do produto. Não à toa, o próprio PMI reconheceu a importância dos gerentes conhecerem mais sobre os seus produtos de negócio, realizar engenharia de valor e usar técnicas provadas de análise de negócio. A certificação de Analista de Negócio do PMI é um movimento nessa direção e hoje já existem excelentes cursos de pós-graduação para a formação de analistas de negócio.
Modelo 2 – Gerente Como Scrum Master
Para Squads menores e onde o gerente tenha um domínio técnico do assunto sendo tratado pude já observar o gerente assumindo também o papel do Scrum Master.
Isso pode ser positivo para limpar impedimentos em organizações muito hierarquizadas, onde o crachá gerencial é fundamental para conseguir ajuda de outras áreas.
Existe aqui o risco do gerente atuar como um decisor técnico e inibir o desenvolvimento do time. E nesse modelo devemos ter extremo cuidado para não reforçar ou manter os cacoetes de microgerenciamento.
Modelo 3 – Gerente Como Agile Coach da Tribo
Nesse modelo o gerente se desapega do trabalho operacional e começa a atuar como um construtor de capacidades do time no nível da tribo. Com isso ele consegue atuar em várias Squads e estabelecer uma consistência do trabalho.
Realizar esse trabalho é árduo e requer uma mudança nos modelos mentais preestabelecidos. No nível gerencial, a principal função a ser buscada é desenvolver pessoas. E no nível do time, a principal função a ser buscada é operar como uma unidade autogerenciada de alta performance e que busque melhorias contínuas no seu processo de trabalho.
Existe um risco no exercício dessa função que lida com o paradigma de gestão. Pessoas não devem ser gerenciadas. Ao invés, o gerente deve cuidar do sistema em torno das pessoas e nos incentivos que irão permitir que as pessoas se motivem. E não falo aqui de incentivos financeiros. Para trabalhos de natureza intelectual, já foi demonstrado que o aspecto mais importante na motivação de pessoas é a autonomia na tomada de decisões.
Vamos tomar um exemplo de uma ideia gerencial que parece ser boa mas que pode ser usada de forma inadequada, que são as reuniões individuais de acompanhamento. Se o gerente usa as reuniões um-para-um para estabelecer objetivos individuais e posteriormente solicita atualizações de status para as pessoas ele estará apenas reforçando o relacionamento superior-subordinado que é típico nas organizações de comando e controle.
Everyone should learn how to manage the system, not the people, Jurgen Appelo
Quando um gerente decide atuar como Agile Coach, ele deve usar práticas gerenciais que:
- envolvam as pessoas e promovam as suas interações;
- permitam ao time melhorar o sistema;
- ajudem a engajar e aproximar os clientes do time e do produto sendo construído.
Uma prática gerencial importante e que atende a essas condições são retrospectivas. Um outro exemplo é a prática Vá Ver (Genchi Genbutsu), que permite que os gerentes acompanhem os seus times no trabalho real e possam discutir formas de melhorar o sistema.
O portal do Management 3.0 traz uma excelente coleção de práticas que atendem aos requisitos acima e pode ser usada para que gerentes migrem do nocivo modelo comando e controle (Management 1.0) para um papel mais próximo ao de coaches.
Modelo 4 – Simplesmente Reduzir o Número de Gerentes na Organização
Quando olhamos as organizações que migram de modelos hierárquicos e silos funcionais para o modelo de squads, observamos que algumas gerências simplesmente deixam de existir.
Vou trazer um exemplo no contexto de QA e testes de software. Em empresas hierarquizadas, temos gerentes de testes que chefiam um pool de pessoas e gerenciam filas de requisições para prestar serviços de verificação e validação de sistemas para outras áreas da organização. Quando operamos por Squads, os analistas de testes estão agora dentro das Squads. E agora os próprios analistas de testes se reunem periodicamente (ex. comunidade de práticas de testes) para realizar retrospectivas do seu trabalho e também para desenvolver a competência organizacional de testes na organização.
Esta visão vai na direção da descentralização gerencial e que é bastante enfatizada por Neils Pflaeging no seu excelente livro – Organizar para a Complexidade. E o mantra aqui é: Mais Gestão, com Menos Gerentes.