Chegamos à quarta métrica essencial para a gestão do seu sistema de trabalho, a vazão. Em conjunto com as métricas de Trabalho em Progresso, Tempo de Entrega e Eficiência de Fluxo, descritas anteriormente aqui, você terá condições fortes de identificar fragilidades e introduzir estressores de melhoria para criar serviços cada vez mais aptos para o propósito.
Caso você não tenha lido os posts anteriores, veja aqui as Partes 1, 2 e 3.
- Parte 1 – Tempo de Entrega
- Parte 2- WIP – Trabalho em Progresso
- Parte 3 – Eficiência de Fluxo
A vazão (throughput) é uma medida de quanto trabalho você recebe ou entrega por período de tempo. Por exemplo, quantas histórias do usuário o seu time entrega por semana, ou quantos épicos o seu time entrega por trimestre.
A vazão está intimamente ligada à sua demanda e capacidade e, portanto, essencial para você compreender se o seu sistema de trabalho está equilibrado e se a sua produção está apta ao seu propósito.
Um exemplo simples – Chegadas e entregas de pedidos em um restaurante
Vamos compreender esse conceito primeiramente um contexto de pedidos em um restaurante em um certo turno de trabalho.
Você, como gerente da expedição, olha para os números e observa a seguinte demanda de pedidos.
11:00 as 12:00 – 20 pedidos
12:00 as 13:00 – 45 pedidos
13:00 as 14:00 – 35 pedidos
14:00 as 15:00 – 10 pedidos
Você olha também para a sua capacidade de entrega e observa o seguinte:
11:00 as 12:00 – 10 entregas
12:00 as 13:00 – 40 entregas
13:00 as 14:00 – 35 entregas
14:00 as 15:00 – 15 entregas
Ao observamos a demanda e a capacidade, vemos que temos um sistema em desequilíbrio. Pedidos se acumulam entre 11:00 e 13:00, e somente depois desse horários começamos a ter uma vazão de saída maior que a vazão de entrada.
Isso fica mais aparente ao enxergarmos isso graficamente, em um gráfico que mostra os pedidos e as entregas de forma acumulada no período onde o restaurante ficou aberto (11:00 as 15:00). A barriga azul mostra o desequilíbrio durante o período de atendimento.

“Mas a barriga é tão pequena”, alguém pode dizer.
Não necessariamente. Veja que entre 12:00 e 13:00 temos quase 20 pedidos empilhados na cozinha. E cada pedido representa alguém com fome. Alguém, literalmente, com a barriga roncando. Então tenha atenção às barrigas nos gráficos de chegadas e partidas, criado nos anos 60 por John Little e que agora é conhecido na comunidade de agilidade como Fluxo Cumulativo de Valor.
Um exemplo real em um time de desenvolvimento de software
Vamos para um caso real agora em um time que cuida de melhorias em um sistema de TI, mas que poderia ser usada em qualquer trabalho do conhecimento (marketing, publicidade, RH ou áreas contábeis)

No começo de Abril, início da nossa análise nesse gráfico, a barriga amarela é pequena e não maior que 10 atendimentos empilhados. Mas durante o período de análise vemos que a barriga começar a crescer e observamos que ao longo de maio já temos quase 50 atendimentos empilhados. Em outras palavras, o WIP ( trabalho em progresso) cresceu de 10 para 50.
Esse gráfico mostra um sistema de trabalho desequilibrado. O efeito prático para os demandantes serão tempos de entrega cada vez piores. Sabemos que quanto maior o WIP, maior será o tempo de entrega. A relação entre o WIP e o tempo de entrega é mostrada abaixo, na fórmula que é conhecida como Lei de Little.

Em termos super simples, entenda que essa relação lhe diz que se você não controlar o seu WIP, o tempo médio de entrega das suas demandas será muito alto. E, além disso, a sua taxa de entrega (ou vazão) será muito baixa.
Além disso, a consequência da demanda e capacidade em desequilíbrio é que as pessoas se tornam sobrecarregadas. Isso implica em estresse, menor rendimento, mais defeitos e mais retrabalho no seu sistema de trabalho. Organizações de maturidade zero no KMM sempre apresentam sobrecarga e sistemas de trabalho com forte desequilíbrio.
Usando a vazão para melhorar a saúde do seu sistema de trabalho
Até agora vimos que a vazão pode revelar se a sua demanda e capacidade estão desequilibrados. Isso é chamado de um sistema instável. E isso não é bom.
Para criar sistemas estáveis, precisamos buscar equilibrar a demanda com a capacidade. Existem duas formas de lidar com isso:
(1) Aumento da capacidade (Taxa de Saída)
(2) Limite da demanda (Taxa de Entrada)
O aumento da capacidade (1) é um processo orgânico e depende de muita repetições de estressores de melhoria (ex. práticas de agilidade ou práticas DevOps). Ao mesmo tempo, a capacidade pode ser muito impactada se não houver limite da demanda. Isso porque os colaboradores precisam trocar de contexto e o efeitos de filas, bloqueios e impedimentos se manifestam com muito mais frequência.
Ou seja, a melhor forma de criar um sistema estável, reduzir tempos de entrega, qualidade e previsibilidade é trabalhar no limite de demanda (Taxa de Entrada) (2).
Isso pode ser realizado de uma forma simples olhando a quantidade de entregas nos últimos períodos (ex. semanas ou sprints). Veja o gráfico abaixo, que mostra a quantidade de entregas realizadas ao longo de cinco sprints.
Observamos que nesse período tivemos entre 76 a 132 entregas, com um média de 108 entregas.

A taxa de entrega é distribuída de forma Gaussiana, i.e, podemos usar os valores das médias para projeções futuras. De forma simples, um gerente que observe o seguinte comportamento poderia se comprometer com 108 demandas para o próximo sprint. Isso cria um limite de entrada seguro, que te apresenta muitas vantagens gerenciais tais como:
- Previsibilidade de entregas;
- Estabilização do WIP;
- Redução do tempo de entrega;
- Contribuição para a criação de um sistema estável;
Um sistema estável é um sistema de entrega previsível – aquele que permite que você tome decisões baseadas em dados confiáveis e produz previsões probabilísticas precisas. Em sua forma mais simples, o fluxo de trabalho de entrega funcionará como um sistema estável quando você mantém um trabalho em andamento consistente e uma idade média consistente de trabalho em andamento ao mesmo tempo.
Usando a vazão para identificar gargalos e promover conversações ricas
Uma outra grande utilidade do gráfico de vazão é identificar gargalos. Considere o exemplo abaixo, que mostra um processo de trabalho com etapas de Análise, Desenho e Implementação e um processo de desenvolvimento de software.
Observe a coluna chamada de Throughput items/day, que significa a vazão média de saída. Podemos observar que a vazão média das etapas é diferente, sendo que a maior vazão é a etapa de análise (0.62) e a menor vazão é a etapa de testes (0.58). Observe, então, que a etapa de testes se apresenta com o gargalo do nosso sistema de fluxo.

Alguém apressado ou ingênuo poderia dizer. “A culpa é do time de testes”.
As razões, no entanto, podem ser muito mais complexas do que isso e podem envolver:
- Dívida de fluxo (trabalho mal especificado ou mal desenvolvido, que provocam bloqueios e impedimentos na etapa de testes)
- Trabalho em progresso alto na etapa de testes.
- Um processo de engenharia de testes ruim, com muito esforço e retrabalho manual.
No mundo real, identificar os gargalos permitem que possamos criar conversações ricas entre os times de forma e reequilibrar o fluxo. Um fluxo saudável deve habilitar uma vazão média similar ao longo das etapas, que contribui também para melhorar a estabilidade do sistema.
Métrica de vazão – Um canivete suíço para a sua gestão

A vazão (de entrada e saída) é um ferramenta poderosa para a sua gestão. Com ela você pode:
- Observar se o seu sistema está instável, com demanda e capacidade desequilibrados.
- Controlar o WIP (trabalho em progresso)
- Reduzir a sobrecarga no time
- Equilibrar a demanda e a capacidade
- Reduzir tempos de entrega
- Melhorar a saúde do seu sistema de trabalho.
Use o fluxo cumulativo de valor como ponto de partida para compreender como o trabalho e chega e parte do seu sistema de trabalho e pouco a pouco comece a equilibrar o seu trabalho.